Há tempos que agricultores de todo o mundo manipulam genes de plantas e animais, sem mesmo sabermos sobre a existência de genes e cromossomos. A seleção das melhores sementes e dos melhores animais de um rebanho para cruzá-los entre si existe no mínimo há 10 mil anos. O melhoramento genético tradicional, como é chamado, transformou as plantas e os animais radicalmente, daquilo que eram quando o homem começou a trabalhar com eles para o que temos hoje. O objetivo dessas modificações é óbvio: aumentar a produção e a qualidade de sementes, frutos, plantas, bois, cavalos etc. Ao cruzar animais e plantas com características desejáveis os produtores conseguiram criar variedades importantes para o melhoramento. Entretanto, ao mesmo tempo, tiveram um grande trabalho para tirar, também por meio de cruzamentos, características indesejáveis nessas novas variedades.
Existem dois métodos para produzir uma planta transgênica: usar uma bactéria chamada Agrobacterium tumefaciens ou por meio de biobalística. A técnica de se utilizar uma bactéria para transferir genes específicos a um vegetal surgiu quando cientistas observaram que o A. tumefaciens inseria trechos de seu DNA numa planta, provocando a doença galha de coroa, ou seja, é um processo que acontece na natureza.
A partir da observação dessa interação, pesquisadores criaram a técnica que consiste em três passos: 1) Retira-se do micróbio o seu plasmídio (uma pequena molécula de DNA) e dele se extrai o gene causador da doença. 2) No plasmídio é inserido um gene de interesse, por exemplo o gene que torna o vegetal resistente a insetos. 3) Então é devolvido o trecho de DNA modificado para o A. tumefeciens. Para a transferência do DNA modificado para a planta, basta apenas colocar a bactéria em contato com a planta, milho, por exemplo, e ele irá transferir para o vegetal o gene de resistência a insetos. Esta nova planta, dotada de uma característica que não tinha antes, é chamada de transgênica.
Na biobalística, partículas microscópicas de ouro ou tungstênio são cobertas com os genes escolhidos e literalmente atiradas contra as células do vegetal que se pretende modificar. Á medida que se chocam com elas, algumas partículas penetram nas células, inserindo nas plantas os genes com o traço desejado.
Uma planta geneticamente modificada traz, muitas vezes, vantagens para suportar as adversidades do ambiente. É o que ocorre, por exemplo, com o milho e o algodão que recebem o gene que os tornam resistentes a certos insetos. Esse gene vem da bactéria Bacillus thurgiensis (Bt), que produz uma toxina contra insetos. O Bt vem sendo usado há anos na agricultura orgânica como bioinseticida natural. Sua desvantagem é que, ao ser espalhado na lavoura mata todos os insetos sensíveis a ele, indiscriminadamente. No caso da planta transgênica, que tem o Bt dentro de seu genoma, somente o inseto que a ingere morre, uma utilização que é mais sensata sustentável.
Outro exemplo é a soja que tem inserido em seu genoma um gene que a torna capaz de processar o glifosato, um herbicida largamente utilizado para matar ervas daninhas que crescem junto com o cultivo da soja. Sem o gene da resistência ao glifosato, o agricultor não poderia aplicar o produto após a soja germinar, pois a mataria junto com as ervas daninhas. Nesse caso seria necessário a utilização de pelo menos duas aplicações de outros dois tipos de herbicidas na cultura para matar as plantas daninhas, mais caros e não biodegradáveis. A presença do gene de resistência ao glifosato permite que ele seja aplicado na soja sem matá-la. Isso porque o gene é capaz de degradar o herbicida, transformando-o em um composto não tóxico para o vegetal.
Para o melhorista, a principal vantagem da utilização de transgênicos parece ser a possibilidade da utilização de genes que não poderiam ser obtidos pela hibridação. Outra vantagem é a possibilidade de introdução de um gene específico sem a necessidade de cruzamentos e retrocruzamentos, diminuindo o número de gerações e o tempo gasto para o desenvolvimento de uma nova cultivar. O produtor é diretamente beneficiado, principalmente pela diminuição do custo de produção e do uso de agrotóxicos. Para o meio ambiente, o uso de plantas transgênicas pode levar a um menor uso de defensivos, diminuindo a poluição ambiental.
A produção de plantas transgênicas, apesar de trazer uma série de vantagens ao melhorista, não diminui a importância do melhoramento convencional. Na verdade, as técnicas de engenharia genética vieram auxiliar o melhorista a fazer um trabalho mais rápido e eficiente. Além disso, a transgenia não foi algo inventado pelo homem. Bactérias já a usam há milhares de anos!
Sydney Antonio Frehner Kavalco é agrônomo, mestre e doutorando em Biotecnologia pela Universidade Federal de Pelotas. Atualmente é bolsista CNPq e atua no melhoramento genético de trigo