Nossa própria origem sempre foi motivo de discussão no mundo acadêmico e cotidiano. Através dos séculos de civilização milhares de especulações acerca de onde viemos nublava o imaginário dos povos antigos. Com o surgimento da paleoantropologia e das análises evolutivas com base na reconstrução fóssil, dispomos de um cenário que melhor nos aproxima do que realmente ocorreu. Excluindo-se as explicações místicas e religiosas, a ciência nos mostra resumidamente, como se deu nossa diferenciação frente aos outros primatas, e quais mecanismos seletivos levaram ao nosso atual aspecto.
O continente africano é hoje corretamente rotulado como o berço de nossa espécie, baseando-se no evento de que os mais antigos fósseis classificados até o momento tem sua origem nessa área, especialmente nos arredores do lago Turkana e no Chade. Os mais famosos aparentados que possuímos, sendo um intermédio e elo de ligação com os grandes primatas, são os diversos Australoptecíneos provenientes de regiões do Quênia, Australopitecus africanus e Australopitecus afarensis, por exemplo. A bipedalia é algo que separa a espécie humana dos demais vertebrados. Esta característica teve seu aparecimento por volta de 2,5 milhões de anos, selecionada ao longo de incontáveis gerações desde um desastre que secou as planícies africanas, levando nossos ancestrais a deixar a procura de alimentos nas árvores transferindo-se para o solo.
Deve-se ser demonstrado também o fato de que as espécies mais antigas na escala evolutiva alimentavam-se de vegetais, dispunha de uma forte mandíbula e musculatura que requeriam grande energia para manutenção. Daí provém uma das interessantes teorias para o aumento da caixa craniana e da massa encefálica: a mudança para a carne, e consequentemente de maiores porções de proteína, teria resultado em menor gasto energético para os músculos mandibulares, permitindo um crânio mais plástico e que através dos milênios de seleção, se estabeleceu com sucesso na população.
Em dado momento, uma parte das populações hominídeas iniciou seu processo de dispersão, parando e se espalhando pela Ásia e, depois, alcançando a Europa, onde já havia uma outra espécie, Homo neanderthalensis, contando com um corpo robusto. À essa altura, a versão original de nossa espécie já se encontrava presente no meio, com cérebro maior e traços ligeiramente mais suaves que de seus aparentados mais próximos. Retornando na escala evolutiva, chega-se ao espécime mais antigo da linhagem humanoide. Encontrado no Chade em 2002, o fóssil de Sahelantropus tchadensis data de aproximadamente 7 milhões de anos. Após restar no planeta, apenas a espécie Homo sapiens, caracterizada por adaptações como bipedalia, consciência metódica e dedos opositores (presentes em espécies antigas, porém não tão bem estabelecidas), desenvolveu propriamente inúmeras características e adaptações. Temos como exemplo sua cultura, cidades onipotentes, impérios, desenvolvimento da linguagem e da agropecuária. Tudo isso, em conjunto, acabou por modificar a paisagem do planeta em alguns milênios mais do que qualquer outro organismo vivo.
Marcos Aurélio da Silva é biólogo e mestrando em Biologia Animal pela Universidade Federal de Viçosa