Você sabe o que são doenças autoimunes?

O sistema imunológico é uma rede complexa de defesa do corpo humano. Ele opera em várias camadas de proteção, sendo a primeira delas uma barreira natural. Essa barreira é composta pela pele, mucosas, secreções, flora intestinal e movimentos peristálticos. No entanto, se um antígeno1 conseguir superar essa barreira, entra em jogo a segunda linha de defesa, que inclui células fagocíticas, o sistema do complemento e a elevação da temperatura corporal. Além disso, existem respostas específicas, como anticorpos, linfócitos T diferenciados e células natural killer. 

As células de defesa têm a notável habilidade de distinguir suas próprias proteínas das proteínas estranhas (tolerância imunológica). Um exemplo disso ocorre durante a gravidez, quando o feto expressa proteínas do pai que são reconhecidas como estranhas ao corpo da mãe. Para evitar que o sistema imunológico da mãe ataque o feto em desenvolvimento, a camada uterina (decídua) inativa genes imunológicos, bloqueando a ação das quimiocinas2 que normalmente recrutariam células de defesa.

Porém, uma pessoa que apresenta uma DAI (Doença Autoimune), os anticorpos ou linfócitos T a depender do tipo da DAI, atacam os próprios tecidos sem motivo aparente. Estas doenças são uma falha na autotolerância que acometem cerca de 3% a 8% da população mundial. Estima-se que cerca de 30% das pessoas que possuem uma doença autoimune não tenham ciência disso.

Tais doenças podem ser classificadas como 1) sistêmicas: como a Granulomatose com poliangeíte, uma vasculite necrosante que acomete principalmente os sistemas respiratório, circulatório e urinário. Nessa doença, anticorpos destroem neutrófilos, células fagocíticas3 granulócitas, que liberam radicais livres e enzimas, causando apoptose e necrose das células próximas; 2) órgão-específicas: como a tireoidite de Hashimoto, onde o corpo não reconhece a tireoide e a ataca, causando diminuição na produção de hormônios.

Vários fatores podem desencadear DAI’s, como fatores ambientais (infecções por antígenos que mimetizam nossas proteínas e peptídeos, fazendo com que as células de defesa nos ataquem), predisposição genética, fatores hormonais e imunológicos e até mesmo o uso de drogas. Além disso, o fator que desencadeou a primeira, pode desencadear uma segunda doença autoimune, sendo assim chamado de poliautoimunidade4.

Essas doenças são mais comuns em mulheres devido à resposta imune mais forte, ou seja, maior concentração de anticorpos. Isso pode ser resultado do estrógeno que demonstra estimular os linfócitos B, que são as únicas células capazes de produzir anticorpos.

Doenças autoimunes não possuem cura, mas em geral são tratáveis, seja por meio de comprimidos diários em caso de doenças mais leves ou, em caso de doenças graves, pulsoterapia e imunossupressores (remédios que inibem ou diminuem a ação do sistema imunológico), que evitam que os anticorpos ataquem células do nosso próprio corpo, porém também nos deixando mais frágeis e sucessíveis a outras doenças, ficando praticamente indefesos.

Figura 1. Demonstração comparativa entre o organismo de pessoas saudáveis, pessoas com doença autoimune e pessoas com a doença que aderem ao tratamento com imunossupressores.
Imagem de: Doenças autoimunes: quando o inimigo é seu próprio organismo — Empresa Brasileira de Serviços Hospitalares (www.gov.br).

Glossário:

Antígeno1: é toda substância estranha ao organismo que desencadeia a produção de anticorpos;

Quimiocinas2: As quimiocinas fazem parte de uma família especializada de citocinas, que funcionam como potentes mediadores ou reguladores da inflamação, pela habilidade de recrutar e ativar subpopulações específicas de leucócitos;

Fagocíticas3: células de defesa que englobam os antígenos e os destroem;

Poliautoimunidade4: é um quadro clínico que consiste de várias doenças imunomediadas simultâneas num mesmo indivíduo.

Maria Eduarda Lacerda Miranda é graduanda em Ciências Biológicas pela Universidade Federal de Viçosa – Campus Rio Paranaíba.

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