Karine Frehner Kavalco.
Não é incomum que mulheres em idade avançada, próximas da menopausa (época em que alterações hormonais drásticas acontecem), tenham medo de engravidar. Esse medo é totalmente justificado, e apoiado pela ciência. É sabido que a idade materna, além de outros fatores diversos, pode aumentar a chance de ocorrerem problemas na gestação. Embora tenhamos hoje um conhecimento bastante completo das necessidades e características de portadores de alterações cromossômicas, o que faz com que tratamentos diferenciais estejam disponíveis, a maior parte dos futuros pais sabe que cuidar de uma criança especial demanda um preparo maior e potencialmente um esforço maior também.
Grande parte dos portadores de alterações cromossômicas possuem um tipo de alteração chamada aneuploidia. As aneuploidias são caracterizadas pela presença de cromossomos individuais a mais ou a menos no cariótipo (conjunto dos cromossomos) do paciente. As aneuploidias podem ser de vários tipos, mas a mais comum entre humanos é a trissomia, que corresponde à presença de um trio de cromossomos onde normalmente deveria haver um par cromossômico (onde um cromossomo é herdado do pai e um cromossomo é herdado da mãe).
A trissomia mais comum em humanos é a do cromossomo 21, também conhecida como Síndrome de Down. A síndrome recebe esse nome em homenagem ao médico que primeiramente a descreveu em 1862, John Langdon Down. Alguns estudos científicos procuram explicar a associação entre idade materna avançada e trissomias autossômicas, visando criar políticas de prevenção. Apesar de esta relação estar bem estabelecida, ainda não se conhece sua exata causa. Pelo menos 3% das gravidezes reconhecidas são trissômicas e este número sobe para mais de 90% entre os abortos espontâneos. Apenas algumas trissomias são compatíveis com a sobrevivência do recém-nascido (a dos cromossomos X, 13, 18 e 21, por exemplo) e a frequência da maioria das demais trissomias, que acaba sempre em abortos, aumenta com a idade materna. Também se sabe que na maioria dos casos, os gametas femininos (ovócitos) são os responsáveis pelas alterações cromossômicas nas crianças. Uma das hipóteses que pode explicar esta relação é a diminuição da quantidade de ovócitos com o passar do tempo. Durante a vida fetal, os ovócitos de uma menina são estimados em cerca de sete milhões de células, e este número cai drasticamente ao longo da vida da mulher. Desta forma, os pesquisadores indicam que a associação entre a idade cronológica e gravidezes trissômicas implica na associação entre número de ovócitos da mãe e trissomias, onde o risco de uma gravidez trissômica aumenta quando diminuem os números de ovócitos em seus ovários. Como a menopausa ocorre quando o número de folículos nos ovários chega a um limiar, uma das hipóteses é que a menopausa ocorre antes em mulheres que tem gravidezes trissômicas do que em mulheres com gravidezes cromossomicamente normais (tanto quanto a abortos ou nascimentos). A pergunta então seria se a menopausa ocorre naturalmente antes no grupo das mulheres que tiveram abortos espontâneos em que foram diagnosticadas estas alterações cromossômicas.
Estudos atuais mostram que as mulheres que tiveram gravidezes trissômicas chegam à menopausa cerca de um ano, em média, antes das que tiveram gravidezes normais. Embora os estudos mostrem que não se pode associar grau de escolaridade, etnia ou tabagismo com a chegada mais adiantada da menopausa, pode-se fazer esta associação em relação à ocorrência de gravidezes trissômicas. A idade média da menopausa tende a ser menor para todos os tipos de trissomias, com exceção das dos cromossomos 6 a 12. Em relação ao cromossomo 21, existe uma correlação direta entre a idade materna e a incidência da trissomia, e acredita-se que tal relação possa ser feita para a maioria das demais aneuploidias.
Alguns cientistas acreditam que possa haver alguma alteração hormonal, defeitos na maturação do ovócito ou mudança nos níveis das proteínas responsáveis pela segregação dos cromossomos, que leva a estes resultados. Assim, estas evidências demonstram uma clara relação entre a idade da menopausa materna e gestações de fetos com trissomias cromossômicas. Isso não quer dizer que mulheres mais velhas não possam ser mães, longe disso. É perfeitamente possível que uma mãe com mais de 40 anos tenha um bebê completamente saudável. Mas é preciso que os médicos alertem as futuras mães sobre a probabilidade aumentada de elas terem uma gravidez trissômica, que pode gerar uma criança com necessidades especiais e influenciar a mudança dos planos que toda mulher faz para o futuro de seus filhos.
Karine Frehner Kavalco é bióloga, mestre em Genética e Evolução e doutora em Genética. É professora do campus de Rio Paranaíba da UFV e atua na área de Evolução.
Como citar esse documento:
Kavalco, K.F. (2010). Quando a idade chega, é preciso pensar bem. Folha biológica 1 (2): 3