As modificações o último par de pernas das Scolopendridae

As pressões evolutivas transformaram as pernas de diversos táxons dos artrópodes, levando ao surgimento das mais diversas modificações, inclusive nos Myriapoda, os famosos seres com elevado números de pernas. Apesar de não parecerem especiais, os artrópodes têm diversas especializações nos Chilopoda, animais popularmente conhecidos como lacraias. Uma das modificações mais conhecidas das lacraias é a exaptação1 das pernas anteriores em forcípulas2.

Os últimos pares de pernas também possuem uma diversidade morfológica ampla e com várias funções diferentes. Algumas observações feitas em campo já mostraram que uma das funções é a ancoragem. Além disso, os últimos pares de pernas podem também auxiliar as pernas locomotoras na caça de morcegos em cavernas, que é o ambiente do qual muitas espécies preferem. Algumas lacraias, como a S. spinosissima, quando se sentem ameaçadas arqueiam e movimentam o último par de pernas para afugentar possíveis predadores. Há também as que possuem espinhos (ou esporões) acessórios, que podem auxiliar na proteção. Algumas espécies foram observadas apresentando o comportamento de virar as forcípulas como também o último par de pernas para o mesmo lado de um invasor, possibilitando assim tanto o ataque quanto a defesa, respectivamente.

Além das modificações raptoriais de defesa e ataque, também podem funcionar como órgãos sensoriais. As últimas pernas podem possuir glândulas coxais3, que são quimiossensoriais e que, até então, se tem indícios de que possam ser usadas para comunicação por feromônios e reconhecimentos intraespecíficos. Outra modificação que pode ser muito interessante é o dimorfismo sexual e uso das estruturas em comportamento de côrte, como machos de algumas espécies de Scolopendra spp., que testam a receptividade de fêmeas passando e sacudindo o último par de pernas nas antenas e cabeça de potenciais parceiros sexuais.

Mas, umas das funções mais incríveis, é a de produção de som e autotomia4 das espécies de Alipes sp.. Elas possuem a tíbia e os tarsos achatados e alongados, o que permite a estridulação dessas partes para alertar quem está mexendo com elas. Quando essa estratégia não funciona muito bem, podem atacar ou autotomizar5 as pernas, como lagartixas que deixam a cauda para distrair os predadores. Por último, tem se discutido sobre o potencial de auto mimetismo6 de algumas S. heros, a qual exibem os últimos segmentos e cabeça com colorações muito parecidas, usando os últimos pares com a mesma coloração das antenas, que podem confundir predadores.

Como podem ver, Scolopendridae é uma família de Chilopoda com modificações para lá de diversificadas, tanto estruturais quanto comportamentais.

Imagem: Cameroon flag tail – Alipes multicostis | The “fan-tailed” o… | Flickr.

Glossário:

Exaptação1: é quando uma adaptação biológica que foi selecionada para uma determinada função é usada para uma nova função.

Forcípula2: apêndice raptorial com função de injetar a peçonha.

Glândulas coxais3: glândulas da coxa.

Autotomia4: é a capacidade que alguns animais possuem de soltar partes do seu corpo em uma automutilação. Geralmente é usada como meio de defesa contra a predação, para distrair os predadores.

Estridulação5: produção de ruído agudo, estridente, vibrante, por alguns insetos por meio do atrito de duas estruturas quitinosas.

Auto mimetismo6: Imitação de uma parte do próprio corpo…..

Rafael Pereira Paulino da Silva é graduando em Ciências Biológicas pela Universidade Federal de Viçosa – Campus Rio Paranaíba.

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