Xenohyla truncata: A perereca jardineira das florestas
A polinização é um processo que consiste no transporte de grãos de pólen entre as flores, em que o grão produzido e liberado pela antera é recebido pelo estigma, parte da flor adaptada para receber esse pólen. Por meio desse processo, ocorre a reprodução das plantas, já que, por meio do grão de pólen liberado, o gameta feminino (oosfera) é fecundado pelo gameta masculino (anterozóide), gerando uma nova planta.
Ao pensarmos em polinizadores, é comum pensarmos nas abelhas, borboletas, vespas e até mesmo em morcegos, mas nunca em anfíbios. Seria possível existir um anfíbio polinizador? Aparentemente, sim! A Xenohyla truncata, popularmente conhecida como Perereca-Comedora-de-Frutas, vive na Mata Atlântica e seu nome popular já entrega muito sobre sua dieta. A maioria dos anfíbios é carnívora, se alimentando, principalmente, de pequenos insetos. Porém, estudos de análise estomacal de espécimes de coleções herpetológicas já haviam demonstrado que a dieta da X. truncata era onívora, ou seja, essa espécie se alimentava de insetos e também de pequenos frutos, além de outras partes da planta. Porém, até então, ainda não tinham sido feitos registros desse animal se alimentando na natureza.
Animais que se alimentam de frutas são considerados dispersores, já que, ao defecar, as sementes da fruta acabam saindo junto com as fezes, podendo ser levadas para outros lugares, o que auxilia no processo de reflorestamento. Isso faz com que o “se alimentar de frutas” já seja algo inusitado para essa perereca, mas não é só isso que a torna tão especial. Recentemente, pela primeira vez foi registrado em fotografias e filmagens o momento exato da Perereca-Comedora-de-Frutas se alimentando e uma grande descoberta foi feita: elas foram flagradas comendo néctar! Porém, algumas flores eram pequenas demais para as pererecas e era necessário que elas literalmente entrassem dentro da flor, o que colabora para o grude de pólen em sua pele. Além de ser um registro inusitado, foi percebido que o pólen ficava grudado em sua pele, o que a tornaria uma potencial polinizadora, já que, ao interagir com outras flores, esse pólen grudado entraria em contato com outro néctar, garantindo uma alta demanda genética.
É um registro raro que tem grande importância para diferentes áreas da ciência, que vão desde a botânica até a herpetologia e, principalmente, para a conservação. Essa espécie pode ser encontrada nas áreas de restinga do Rio de Janeiro, locais bastante ameaçados, principalmente devido à expansão das cidades e outras atividades exercidas pelos seres humanos. Esse fato tem total relação com a conservação dessa perereca, afinal, se a restinga for destruída, toda sua população estará em risco. Ainda são necessários mais estudos nessa área, já que essa descoberta é bastante recente, mas, já podemos dizer que o título de “perereca jardineira da floresta” já pertence à X. truncata, não é mesmo?
Beatriz de Faria Alonso é graduanda em Ciências Biológicas pela Universidade Federal de Viçosa – Campus Rio Paranaíba.