Você já pensou sobre o que faz de nós tão diferentes de outros animais? Arte, ciência, música e a própria organização social que construímos é tão distinta de tantas outras espécies quando comparamos, seja com insetos, invertebrados marinhos ou até outros primatas existentes. Mesmo entre os primatas, embora possamos apontar características comuns entre nós, ainda parece haver um abismo entre a forma como nossa espécie se comporta e se organiza, apresentando singularidades que sempre nos fascinaram e desafiaram nossa compreensão.
Em um primeiro momento é comum pensar que o tamanho do cérebro humano seja um dos principais motivos pelo qual nossa espécie mostra adaptações tão únicas, e de fato o tamanho o nosso cérebro tem uma influência direta nestes aspectos, pois ao comparar com outros hominídeos, chegamos à conclusão de que Homo sapiens possuem maior proporção cérebro-corpo que outras espécies como H. erectus ou H. habilis. Todavia, o tamanho do cérebro sozinho não é suficiente para explicar a complexidade do nosso comportamento, apois baleias ou elefantes possuem tamanhos absolutos de cérebro muito maiores que nós.
Indo mais a fundo, precisamos entender o que fez com que nosso cérebro se desenvolvesse de forma tão particular. Um dos exemplos mais conhecidos pela neurociência está na capacidade de utilizar e desenvolver ferramentas, embora não seja exclusivo da nossa espécie. O uso de ferramentas por espécies humanas ancestrais teria possibilitado um desenvolvimento refinado de determinadas áreas do cérebro, permitindo que pudéssemos manipular e criar ferramentas cada vez mais complexas. Além disso, uma dieta variada também relaciona-se com o desenvolvimento cerebral destacado, uma vez que este órgão é de alta demanda energética, exigindo cerca de 20% de toda energia que consumimos. Assim, apresentar elevado consumo calórico influenciou em parte para que pudéssemos desenvolver tais características.
Para além das causas e consequências mencionadas, a diferença que pronuncia o ser humano dentre os outros animais pode ser encontrada ao observarmos nossa neuroanatomia, a forma do nosso cérebro, suas regiões e seus fenômenos químicos e elétricos. O neocórtex, a camada externa do cérebro, apresenta o maior grau de complexidade em nós humanos. Trata–se da parte do cérebro tida como a responsável pelo que chamamos de funções superiores, como a cognição, pensamento abstrato, linguagem,memória e aprendizagem. É possível observar nestas regiões uma menor densidade neuronal quando comparamos com primatas próximos evolutivamente, em consequência do aumento da relação cérebro-corpo, permitindo que estruturas como axônios, dendritos ou fenômenos como as sinapses e processos gliais pudessem ocupar mais espaço, conferindo uma maior conexão entre as áreas do córtex cerebral, finalmente acarretando na complexidade do nosso comportamento, tal qual vivenciamos hoje.
Por fim, é válido ressaltar a importância de regulação gênica que acompanha essas mudanças neuroanatômicas e neurofisiológicas. Um grupo de proteínas chamadas trombospondinas atuam na regulação e formação de sinapses no cérebro, propiciando uma maior plasticidade sináptica, isto é, criando uma maior possibilidade de conexões sinápticas, além de atuarem na regeneração de lesões, servindo como um modulador.
Fonte: tamanhos comparativos de hominídeos. Adaptado de Tahmasebi (2022).
Referências:
LEONARD, William et al. Effects of Brain Evolution on Human Nutrition and Metabolism. Annual Review of Nutrition, 27(1), 311–327. 2007
TAHMASEBI, Fatemeh et al. A review on brain evolution and development. Journal of Research in Applied and Basic Medical Sciences, v. 8,n. 3, p. 137-144, jul. 2022.
VERENDEEV, Andrey et al. Human brain evolution. Current Opinion in Behavioral Sciences, 16, 41–45.201.
Thalys Augusto de Souza Ribeiro, é biólogo em Ciências Biológicas pela Universidade Federal de Viçosa, campus Rio Paranaíba.
Laura C. dos Santos, é bióloga em Ciências Biológicas pela Universidade Federal de Viçosa, campus Rio Paranaíba.
Thiago Hernandez, é biólogo em Ciências Biológicas pela Universidade Federal de Viçosa, campus Rio Paranaíba.