Simone Rodrigues Slusarski
Os naturalistas que vieram ao Brasil no século XIX haviam tomado a difícil decisão de viajar, pois além dos perigos da viagem, a comunidade científica não era unânime quanto à valorização do trabalho do viajante. Muitos dos mais importantes naturalistas europeus nunca viajaram. Para esta função treinava-se jardineiros coletores, desenhistas, pintores e preparadores de animais que acompanhavam ou substituíam os próprios naturalistas. O exemplo mais conhecido do pesquisador que defendia a viagem como parte indispensável foi Alexander von Humboldt. Acreditava que as impressões estéticas vivenciadas pelo viajante, fazia parte da atividade científica e não podia ser substituída por descrições ou amostras destacadas dos lugares de onde foram tiradas. Alguns dos viajantes-naturalistas que vieram ao Brasil e foram influenciados por esta ideia de Humboldt, como Martius e Saint Hilaire, optaram pelas expedições, pelo simples fato de “ver com os próprios olhos” e assim produzir ciência in loco. Muitos cientistas vieram ao Brasil e cada um deixou uma importante contribuição científica retratando o ambiente, a história e os costumes de nossos povos.
Langsdorff esteve aqui em 1803 e retornou em 1813 como cônsul da Rússia. Em 1820 foi encarregado pelo governo Russo a organizar uma expedição científica, a qual fizera parte Riedel e Freyreiss. Esta missão organizou um herbário com 60.000 exemplares que foi levado para São Petersburg, hoje Leningrado. Sellow nasceu em 1789 na Alemanha, conheceu Humboldt e Langsdorff, veio jovem para o Brasil e com recursos financeiros dos dois amigos pode desenvolver suas pesquisas. Foi Sellow o botânico que forneceu a maior quantidade de material utilizado na Flora Brasiliensis, publicação de Martius. Maximiliano, um naturalista possuidor de recursos financeiros, viajou pelo Brasil de 1815-1817. Em 1820 publicou “Reise nach Brasilien”, retratando a flora e a fauna, com várias ilustrações de próprio punho. Na mesma época, Auguste de Saint Hilaire, por influência de Conde de Luxemburgo, permaneceu no Brasil de 1816-1822. Além de coleta de material zoológico e botânico, contribuiu com observações da geografia humana, história e etnogeografia. Uma de suas obras mais famosas é a Flora Brasiliae Meridionalis, em colaboração com Jussieu e Cambessedés. Em uma passagem nos relatos de suas expedições, Saint-Hilaire retrata a diversidade da Mata Atlântica:
“Nada aqui lembra a cansativa monotonia de nossas florestas de carvalhos e de pinheiros; cada árvore tem, por assim dizer, um porte que lhe é próprio; cada uma tem sua folhagem e oferece frequentemente uma tonalidade de verde diferente das árvores vizinhas. Vegetais, que pertencem a famílias distantes, misturam seus galhos e confundem suas folhas”.
Ele documentou também a extensa devastação feita em nossas matas pelo homem branco, referindo-se ao fato de que as pastagens são queimadas anualmente a fim de se obter erva fresca para o gado e que os fornos de Ipanema eram aquecidos com toras de peroba. Até o presente momento, estes trabalhos foram relevantes para a flora brasileira, porém a obra mais extensa e de maior importância para o Brasil, no que diz respeito a sua vegetação, foi a de Carl Friedrich Phillipp von Martius. Martius nasceu na Baviera em 17 de abril de 1794, veio ao Brasil integrante de uma comitiva de sábios reunidos para acompanhar D. Leopoldina, a Arquiduquesa que havia contraído casamento com Pedro I, herdeiro da coroa portuguesa. Os pesquisadores chegaram ao Brasil em 15 de julho de 1817 e iniciaram imediatamente suas expedições pelas matas de Santa Tereza, Tijuca e Niterói. Além da taxonomia de plantas superiores escreveu também sobre nossas plantas medicinais, criptógamas, observações fitogeográficas, questões etnogeográficas, assuntos linguísticos, costumes indígenas e organizou um mapa fitogeográfico do Brasil. Influenciado por Metternich, Chanceler da Áustria, o imperador desse país e o rei da Bavieria se interessaram pelo trabalho do ilustre botânico e em 1840, foi publicado o primeiro fascículo da Flora Brasiliensis, no formato definitivo como hoje a conhecemos. A obra foi continuada por Eichler e posteriormente por Urban, culminando em 130 fascículos onde são descritas 20 mil espécies.
Muitos outros naturalistas também estiveram aqui com expedições mais restritas, mas também de grande importância. Podemos ressaltar Poeppig (1831-1832), dedicou-se a flora amazônica. Gardner, botânico inglês chegou ao Brasil em 1837, explorou as matas da Tijuca e a Serra dos Órgãos, expandindo mais tarde suas coletas. Regnell, nascido na Suécia em 1807, veio para o Brasil em 1840, patrocinou expedições com Loefgren, Lindman e Malme. Barbosa Rodrigues nasceu em 1842 em Minas Gerais, estudou a flora de vários estados, fundou o Museu Botânico que dirigiu até 1889, no ano seguinte foi nomeado Diretor do Jardim Botânico do Rio de Janeiro. Outros botânicos como Hermann von Ihering, Pilger, Taubert, Leônidas Damásio, Lutzelburg, Schlechter, Pacheco Leão, Wetts- tein, Alberto Loefgren, além de outros não citados, também tiveram grande contribuição em pesquisas relacionadas com a flora brasileira.
Como citar esse documento:
Slusarski, S.R. (2011). Desbravadores de natureza. Folha biológica 2 (2):1