Mariposas causando alvoroço?

Rubens Pazza.

As mariposas salpicadas Biston betularia representam talvez a mais bem conhecida estória na biologia evolutiva. Antes da revolução industrial na Grã Bretanha, a forma mais observada destas mariposas era a clara, salpicada. A forma melânica, escura, foi identificada pela primeira vez em 1848, perto de Manchester, e aumentou em frequência até constituir mais de 90% da população de áreas poluídas em meados do século 20. Em áreas despoluídas, a forma clara ainda era comum. A partir dos anos 1970, entretanto, em decorrência de práticas conservacionistas e consequente diminuição da poluição, a frequência das formas melânicas diminuiu drasticamente, de cerca de 95% até menos de 10% em meados dos anos 90.

Desde 1890, vários trabalhos tentam explicar os fenômenos envolvidos no aumento da frequência da forma melânica, como efeito da cor sobre a eficiência térmica, indução das formas melânicas por efeitos diretos da poluição, entre outros diversos fatores atuando sozinhos ou em conjunto.  Em meados dos anos 50, Kettlewell explicou a mudança na frequência pela ação da caça visual por pássaros. A forma melânica ficava melhor camuflada no tronco de árvores em regiões poluídas, onde a fuligem matou o líquen. Por outro lado, as mariposas salpicadas ficavam melhor camufladas em áreas despoluídas.

Alguns autores, entretanto, afirmam que estas mariposas raramente permanecem no tronco das árvores durante o dia, preferindo regiões mais altas e protegidas.  Recentemente, experimentos simulando a visão dos pássaros demonstraram que os liquens efetivamente promovem uma boa camuflagem para as formas salpicadas. Alguns estudos identificaram um aumento na quantidade destes liquens bem como na frequência de formas claras das mariposas, embora a correlação com a diminuição da poluição ainda não possa ser esclarecida.

Apesar de inúmeros trabalhos demonstrarem que os estudos com a Biston são demonstrações da seleção natural, além de boas experimentações de campo, nos últimos anos alguns autores têm levantado suspeitas sobre os experimentos anteriores e Sargent, em 1998, atribui expressões de dúvida a quase todos os trabalhos passados.  Além disso, um livro lançado há alguns anos, de Janet Hooper, “Of Moths and Men”, acrescenta mais detalhes, concernentes ao convívio de Bernard Kettlewell e o grupo de estudo de E. B. Ford, abrindo margens para más interpretações e desentendimentos. Estes artigos são base para uma série de acusações infundadas. Um extremista antievolucionista, R. Mathews, classificou o exemplo da seleção natural da Biston como sendo uma “asneira científica”. É bom deixar claro que ele não é cientista.

Michael Majerus, um reconhecido pesquisador, autor do livro “Melanism, Evolution in Action”, comenta em um artigo de 2003 sobre as falhas contidas no livro de Hooper e suas acusações feitas a dois pesquisadores falecidos que não podem se defender. Majerus afirma que Hooper se julga capaz de fazer uma crítica mais convincente sobre o tema do que um grupo de pesquisadores geneticistas e entomólogos que passaram a vida estudando as mariposas. Um estudo de L. M. Cook conclui que no melanismo industrial de Biston betularia, tanto o aumento original e a recente diminuição na frequência das formas melânicas são notáveis exemplos de mudança genética natural, intimamente relacionada com a mudança do meio ambiente.

Como evolução é definida pela mudança na frequência das características herdadas ao longo do tempo, e a frequência da forma melânica da mariposa Biston betularia (cujos padrões de coloração são regidos por leis da Genética Mendeliana) aumentou e agora diminuiu em decorrência das leis antipoluição, isto é prova de evolução. Além disso, a velocidade e direção das mudanças podem ser explicadas apenas através da seleção natural, sendo assim, prova da evolução Darwiniana.

Mariposas Causando alvoroço

Rubens Pazza é biólogo, mestre em Biologia Celular e doutor em Genética e Evolução. Atualmente é professor da Universidade Federal de Viçosa, campus de Rio Paranaíba, e atua na área de Genético Ecológica e Evolutiva.


 

Como citar esse documento:

Pazza, R. (2012). Mariposas causando alvoroço? Folha biológica 3 (2):4

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